sexta-feira, 29 de outubro de 2010

GEORGE WASHINGTON CARVER


Corria o ano de 1864. Numa fazenda americana do estado do Missouri, nascia uma criança negra, filho de uma escrava que trabalhava na agricultura local. Ninguém podia imaginar que aquela jovem mãe, que nunca conheceu a liberdade, estava dando à luz o grande cientista George Washington Carver, que se tornaria um dos maiores nomes da pesquisa agro-industrial dos Estados Unidos.
Como todos os demais escravos, nada era seu de verdade. Até o seu nome vinha 'emprestado' de outros. George Washington era uma homenagem ao grande presidente americano e Carver era o sobrenome do patrão a quem ele 'pertencia'. O seu pai tinha morrido num acidente poucos dias antes do seu nascimento e, quando era ainda um bebé de colo, ele e a sua mãe foram raptados por traficantes negros, que os venderiam para outros fazendeiros.
George conseguiu ser resgatado pelo patrão e voltou para a fazenda. Mas a sua mãe faleceu de uma forma brutal nas mãos dos malfeitores. Agora o menino estava só. O único parente que lhe restara era o pequeno Jim, seu irmão, nascido uns dois anos antes dele. O seu destino seria terrível, se não fosse o coração bondoso do senhor e senhora Carver, seus proprietários, que resolveram criar as duas crianças como se fossem seus legítimos filhos.
Os dois irmãos eram um verdadeiro contraste em termos físicos. Jim era forte e ajudava o Sr. Carver nos trabalhos braçais. George era franzino e tinha uma certa dificuldade com serviços manuais. No entanto, a sua inteligência logo se fez notar pela rapidez de raciocínio e inteireza de memória que demonstrava quando o assunto era as maravilhas da natureza.
A Sra Carver possuía um livro de histórias que lia para os meninos todas as noites antes de dormir. Qual não foi a sua admiração ao surpreender George, um dia, a ler em voz alta uma das histórias do livro. É verdade que o garoto gaguejava bastante, porém, mesmo assim, tal cena era de admirar, pois ele jamais tinha assistido a qualquer aula. Tinha aprendido sozinho os princípios básicos da leitura, apenas por observar aqueles que sabiam ler fluentemente.

A CARREIRA ESTUDANTIL

Não demorou muito para que os Carver entendessem que seria um desperdício não dar a George a oportunidade de estudar. O único problema era que, naqueles dias, a presença de uma criança negra não era permitida na maioria das escolas elementares. Por isso, George teve de ser enviado para a cidade de Neosho – Missouri, onde havia uma escola de missionários especializada em alfabetizar crianças negras.
Lá, ele novamente demonstrou uma inteligência acima do normal, que muito surpreendeu os seus primeiros professores. O seu conhecimento de botânica, ciências agrícolas e matemática estava muito acima dos garotos da sua idade. Aquele era de facto um 'geniozinho' que tinha a humildade de não usar o seu intelecto para se sentir superior às outras pessoas. Se o fizesse não teria a aprovação do Deus que ele tanto amava.
Quando terminou a escola básica, George mudou-se para Fort Scott, no Kansas, onde se matriculou na escola de Ensino Médio. Em 1891, pela graça de Deus, conseguiu a proeza de, mesmo sendo negro, ser admitido como aluno na Universidade do Estado de Iowa, onde se tornou Bacharel em Ciências, no ano de 1894. Em 1897, ele ainda concluíu o seu Mestrado em Ciências Botânicas e foi admitido como professor assistente na mesma universidade.
Não pense, porém, que a sua vida foi um mar de rosas. Durante o tempo em que estudava fora de casa, George nunca tinha dinheiro suficiente para pagar as suas despesas. O seu patrão, que o tinha adoptado, entrou numa depressão económica e pouco pôde fazer para lhe mandar alguns trocados. Para pagar os seus estudos, ele enfrentou quase todo o tipo de trabalho temporário. Fez faxinas, jardinagem, cozinhou, e ainda lavou roupas. Como você vê, esses eram serviços voltados para as mulheres, com excepção, talvez, do trabalho de jardinagem. Porém, as necessidades financeiras não permitiam que George escolhesse o emprego. Aquele menino fraco da fazenda revelou-se um grande empreendedor que nunca temeu enfrentar o trabalho pesado.

PROFESSOR DE NEGROS

Logo que Carver iniciou a carreira de professor em Iowa, a sua boa fama espalhou-se pelas universidades dos Estados Unidos. Ele foi o primeiro norte-americano negro a ensinar numa escola de Ensino Superior. Entretanto os seus trabalhos pareciam não beneficiar em nada os demais negros que, como ele, tinham o desejo e a capacidade de estudar. Foi aí que George sentiu um chamado de Deus para fazer algo pelos seus irmãos negros.
Por uma providência do céu, George foi procurado por Booker T. Washington, um renomado educador que tinha fundado um instituto de ensino normal e industrial para os negros do Sul, no Estado do Alabama, que era uma das maiores concentrações de escravocratas do país. Isso foi em 1897 e o Instituto chamava-se Tuskegee Normal and Industrial Institute for Negroes. Carver aceitou o convite e serviu como director daquela escola agrícola até 1943, o ano da sua morte.
O seu ideal era preparar homens e mulheres negros para o mercado de trabalho, transformando a sua vida de ex-escravos ou filhos de escravos numa vida digna de pessoas realmente livres. Os grupos escravocratas, é claro, foram sempre um impecilho às actividades realizadas pelos alunos de Tuskegee. Não foram poucas as vezes em que Carver sentiu de perto a ameaça de assassinato.
Depois de algum tempo administrando com dificuldade o Instituto, George sentiu na pele uma das maiores crises económicas do Sul dos Estados Unidos. As plantações de algodão começaram rapidamente a se desvalorizar no mercado e muitos fazendeiros estavam abrindo falência. O Colégio Tuskegee, que mal se virava com recursos próprios, não suportaria a situação e certamente teria de fechar as suas portas.

A RESPOSTA QUE VEM DE DEUS

Carvier precisava a todo o custo de salvar a instituição, pois muitos jovens dependiam dela. Mas como fazer isso, se as pessoas mais equilibradas financeiramente não estavam a suportar a crise? Sem pensar duas vezes, o sábio director convocou todos os alunos para juntos erguerem fervorosas orações a Deus, de modo que um milagre pudesse acontecer naquele lugar.
E Deus respondeu de um modo assombrosamente maravilhoso. George Carver teve um sonho, no qual se via diante do Deus Todo-Poderoso. Sentindo como nunca dantes aquela febre científica do aprendizado, ele pediu ao Senhor que lhe ensinasse tudo a respeito do Universo. Com a voz de um poderoso trovão, o Senhor disse-lhe que aquilo era pedir muito, pois a sua mente não era tão prodigiosa para compreender tudo sobre o Universo.
“Então ensina-me tudo a respeito do planeta Terra!” – insistiu ele.
“Também é muito. Peça algo mais viável” – retrucou o Senhor.
“Já que não posso conhecer tudo acerca do Universo e do mundo, então ensina-me tudo acerca do ser humano” – sugeriu mais uma vez.
“Não - respondeu o Senhor – o ser humano é também muito profundo para o seu calibre mental.”
Ainda em sonho, Carver sentiu-se frustrado. Tentou pedir o conhecimento sobre coisas 'menores' como as plantas, os animais, a geologia... Porém a resposta era sempre a mesma: “É muito para você!”
Até que ele olhou para o chão e viu um pequeno amendoim que brotava do solo. Para não perder a oportunidade, pediu a Deus que pelo menos lhe ensinasse tudo acerca de um simples amendoim. O Senhor sorriu e admitiu:
“Sim, realmente, aí está algo da Minha Criação que é do tamanho da capacidade humana. Leve esse amendoim para o seu laboratório e estude-o bastante, o Meu Espírito o guiará nesse conhecimento e juntos salvaremos o Instituto.”
Carver acordou meio confuso e tentou compreender o que aquele sonho significava.
Pegou um amendoim na cozinha do refeitório, e levou-o para o seu laboratório, conforme entendeu ser a ordem do Altíssimo. Sabe qual foi o resultado? Carver conseguiu desenvolver 325 produtos derivados do amendoim, que são comercializados até hoje. Entre eles você tem: sabão, queijo, tinta, manteiga, pomada, café, leite, paçoca e outras coisas mais encontradas em supermercados do mundo inteiro.

Empolgado com o insight promovido por Deus, ele ainda manufacturou mais de 100 alimentos da batata-doce e vários outros de plantas e legumes típicos do Sul dos Estados-Unidos. Esses novos produtos ganharam rapidamente o mercado e salvaram não só a situação de Tuskegee, mas a própria economia agrícola do estado do Alabama.
A Universidade de Iowa imediatamente se interessou por essas e outras técnicas de Carver, e as divulgou para o mundo inteiro. Em pouco tempo, gente de toda a parte vinha para lhe pedir orientação de como melhorar o plantio agrícola do seu próprio país. Só para citar alguns exemplos, Mahatma Gandhi solicitou o acompanhamento de Carver na construção e manutenção de um sistema agrícola público a ser implantado na Índia. Até Iossif Stalin encomendou a sua assistência para a fertilização de massivas extensões de terra na ex-União Soviética. O leite de amendoim, que logo se mostrou tão nutritivo quanto o leite de vaca, foi enviado para a África, salvando centenas de crianças da costa oriental do continente. Deus realmente abençoou as pesquisas de George Carver.

UM GÉNIO ALTRUÍSTA

Esse era realmente um homem de visão espiritual. Na sua maneira de pensar, uma pequena flor pode tornar-se uma ponte de comunicação com o Infinito. A sua experiência com o amendoim convenceu-o disso. “Há muito de Deus para se conhecer, e as pesquisas que fazemos são apenas uma gota de um imenso oceano ainda inexplorado.” Para Carver, o poder invisível de Deus sempre desafia o orgulho humano de pensar que pode, por si mesmo, desvendar os mistérios do Universo.
O mais curioso nessa trajectória é que Carver jamais patenteou as suas descobertas. “Deus me deu de graça – ele dizia – como posso vendê-las a alguém?”
Embora Thomas Edson e Henry Ford lhe tenham oferecido altas somas para que abandonasse Tuskegee e trabalhasse para as suas empresas, Carver nunca aceitou abandonar aqueles que, no seu entendimento, precisavam mais do seu conhecimento. “Se eu aceitasse aquele dinheiro – ele dizia – certamente esqueceria o meu povo.”
Carver foi um homem que andou com Deus. Superou as barreiras do preconceito e da provação, mostrando que, se estamos com Cristo, nada temos a temer. Afinal de contas, se Ele pôde fazer tudo aquilo com um simples amendoim, imagine o que não fará com a nossa vida, caso a coloquemos sob o Seu paternal cuidado.


Rodrigo P. Silva in ELES CRIAM EM DEUS
Biografias de Cientistas e a sua Fé Criacionista

Casa Publicadora Brasileira

THE GEORGE CARVER MUSEUM

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

RESPONDER A UMA NECESSIDADE INATENDIDA,

É O TEU CHAMADO.



«Amarás, pois, o Senhor teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de toda a tua força.» Deuteronómio 6:5.


A criança fez exactamente o que a mãe lhe pediu: ficou sentada no bloco de betão, à espera do seu regresso. O sol punha-se e ela ainda não tinha voltado.
Depois de se terem passado três dias, ali estava, sentada no mesmo sítio, à espera da mãe, que nunca mais voltou.

Este facto aconteceu no Boulevard Parks, em St. Petersburg, na Flórida.
Um homem que morava ali perto reparou naquela criança; acolheu-a e pagou-lhe a estadia num acampamento de jovens da sua igreja. Aí, com 14 anos, este menino franzino, ouviu pela primeira vez a história de Jesus, morto na cruz; de Jesus ressuscitado e da possibilidade de passar toda a eternidade com Ele. Ajoelhado, orou: "Jesus, eu quero que Tu perdoes os meus pecados. Eu quero dar-te a minha vida."

Esta decisão acompanhou-o. Quando se tornou adulto, enfrentou a pobreza, a hostilidade, o sofrimento e a fome para levar esse Jesus às crianças dos guetos de Nova Iorque. O sucesso do seu projecto evangelístico para crianças engloba a evangelização de 22 000 crianças por semana, com 22 000 visitas semanais aos seus lares, onde trabalham mais de 100 pessoas a tempo completo e cerca de 350 voluntários.

Esta história ultrapassou as fronteiras de Brooklyn e Harlem e espalhou-se pelo mundo inteiro. Contagiou milhares de adultos que, em todos os continentes, estão a evangelizar as crianças, entre as mais desfavorecidas.

É importante que pensemos que, hoje mesmo, há outra criança sentada num bloco de betão, esperando que alguém supra as suas necessidades de carinho, orientação, estímulo e valorização. Não precisa de fazer nenhuma viagem para a procurar. Ela encontra-se por perto. Na sua família, na sua igreja, na sua vizinhança, ou noutro lugar qualquer.

Sente que pode ser tocado por Deus para cumprir essa missão específica?


Vi na história de Bill Wilson, como por espelho, a vida de Cristo, que foi de negação própria e de sacrifício, tomando o partido dos oprimidos.

Estamos a olhar nessa direcção ou numa outra totalmente oposta?

Que hoje a sua relação com Jesus se faça face a face e não costas com costas!


Amélia Nóbrega





SE TODAS AS GENTES DESSEM AS MÃOS...


Pessoalmente não posso fazer feliz
Toda a humanidade.
São biliões de seres, de pessoas,
De almas aflitas e apáticas
Que em mil línguas e dialectos
Trazem à mente a tragédia da minha limitação.

Habitam o cume dos montes,
O fundo do abismo,
São isoladas ilhas no mar da vida,
Onde só se chega pela estreita ponte da renúncia,
Pelo incómodo barco da tolerância
Para com as fraquezas do próximo.

Mas, atravessando a ponte,
Tomando o barco,
Ou usando cordas de boa vontade,
Posso levar felicidade
Àquele que está perto de mim.
Basta às vezes, um alegre bom-dia,
Um sorriso amigo,
Um elogio sincero.

Pessoalmente não posso fazer feliz
Toda a humanidade.
Mas com a ajuda do Senhor,
Posso estender a mão
Ao que está à minha beira,
E passar-lhe um pouco da felicidade
Que me enche o coração.

Bastará que o gesto seja imitado
Para que a felicidade passe adiante,
A corrente se estabeleça ao redor da terra
Fazendo o fim das guerras,
Dos preconceitos de raça,
Das divisões em castas, línguas e religiões.

Até, estou certa, seria possível,
Quais crianças felizes,


«Brincar de roda em volta do mundo
Se todas as gentes se dessem as mãos.»


Myrtes Mathias




sexta-feira, 15 de outubro de 2010

AINDA TÊM OS NOSSOS ESTUDANTES

RAZÕES DE QUEIXA?...



«Daisy vai à escola por um cabo, a única ligação entre o local onde vive, a 60 km de Bogotá, e o mundo exterior.

Enquanto Daisy Mora se prepara para descer como um foguete para chegar à escola, o seu irmão mais novo, Jamid, olha para ela, inquieto. Com uma voz melancólica, ela tranquiliza o rapazito de cinco anos cantando a canção colombiana do Vaquero, o pastor que suspira pela sua amada. Depois, ela prende-se à roldana ferrugenta que mais faz lembrar um gancho do talho.
Como um caracol na sua concha, Jamid enrola-se no saco de juta. Daisy amarra a carga de cerca de 14 quilos ao gancho da corda da roldana, mordendo os lábios com grande ansiedade. "Finalmente", murmura, enquanto o suor lhe escorre pela testa. Agora, ata as extremidades de uma corda de cânhamo a dois ganchos que prende ao cubo da roda. Cria deste modo uma espécie de baloiço de ganchos onde se senta.



As duas crianças mergulham ao longo do cabo de aço para as profundezas do vale verde-escuro do Rio Negro. Enquanto a roldana chispa e o metal chia ritmadamente, Daisy bate várias vezes na cavilha de aço da roldana para que não se solte. Como o andamento de um combóio de mercadorias, as crianças atravessam o nevoeiro húmido. 360 metros por baixo deles, o rio Negro ruge. Precipitam-se na direcção da encosta da outra margem e, durante segundos, o nevoeiro permite uma visão da floresta tropical, do edifício da escola, do rio e, de novo, da floresta.
São necessários apenas 60 segundos para percorrer os 800 metros do caminho no cabo. A protecção de amortecimento, um pneu velho de camião, parece cada vez maior. Daisy agarra o ramo em forma de forquilha que lhe serve de travão. Faz pressão com o ramo ritmicamente contra o cabo de aço até que o metal chispa, e se solta um cheiro a madeira queimada. Os seus pequenos dedos apertam a madeira contra o cabo. O resto do balanço é absorvido pelo pneu. "Uff!", diz Daisy, "conseguimos outra vez".
Neste vale é o pai que entrega a roldana de ferro aos filhos e lhes explica como chegar à escola com este veículo. A primeira viagem de cada criança é uma espécie de rito de iniciação em que toda a família participa. Enquanto o pai mostra como o travão tem de ser pressionado contra o cabo, a mãe faz o que pode para controlar um ataque de histeria benzendo-se com veemência. E quando a viagem de estreia acaba em bem, festejam e finalmente a mãe pode chorar de alegria e de alívio.


Doze cabos de aço ligam as vertentes de ambos os lados do rio. Para as 15 famílias que aqui vivem em cabanas isoladas, a cerca de 60 kms para sudeste de Bogotá, estes cabos são a única forma de contacto com o mundo exterior.
O explorador alemão Alexander von Humboldt relatou, em 1804, que os nativos utilizavam um sistema de cordas. As primeiras cordas a que os índios se agarraram eram estendidas através de vales e pequenos desfiladeiros.
Com o início da industrialização, as cordas de cânhamo foram substituídas por cabos de aço. Ao longo destes cabos podia ser transportada fácil e rapidamente a madeira, a matéria-prima de que mais necessitavam. Quando a madeira das regiões de acesso fácil já tinha sido totalmente cortada, novos cabos eram instalados em zonas mais remotas da floresta tropical. Quando se atingiu o clímax da exploração florestal nos anos 60, o corte de madeiras passou a ser proibido por lei.
Os cabos sobreviveram à exploração florestal. Os agricultores descobriram que as clareiras feitas nas zonas arborizadas podiam ser utilizadas para a agricultura e pastoreio. O cabo de aço, tendo servido durante dois séculos para o transporte de madeiras, tornava-se agora essencial para o acesso a regiões inacessíveis. Para os colonos, os cabos são o único sistema de transporte de que dispõem. Aquilo que não podem produzir, os homens e as mulheres vão comprar à aldeia de Guajabetal, a cerca de 10 Kms de distância. Com a ajuda dos cabos, a mandioca, o milho e o gado são transportados para o mercado, levando de volta materiais de construção para as cabanas.



Os pimparos, pássaros de penas amarelas, soltam gritos agudos no meio da floresta tropical. Um ribeiro corre sobre as pedras avermelhadas do caminho íngreme que tem de ser desbravado todos os meses a golpes de faca pelos homens e coberto com novas pedras. Enormes árvores Arranyanes com as suas flores vermelhas crescem ao longo do caminho. Daisy e Jamid olham para o outro lado da ravina. Jamid pergunta à irmã quando é que terão idade suficiente para utilizarem o cabo sozinhos. "Para o ano", responde ela. Depois chegam à zona da encosta onde pastam as duas vacas da família.

A cabana da família Mora é feita de tábuas de madeira. Foi o próprio Guillermo Mora, um homem forte de bigode e olhos sorridentes castanhos-escuros, quem a construíu. Diz que a construção é 'arejada': a chuva ao bater nas tábuas abriu-lhes algumas fendas do tamanho de uma mão por onde o vento sopra. A dona da casa, Nidia Cifuentes, pensa que é uma coisa útil. Assim pode sempre ver os filhos lá fora, além de que o fumo permanente da lareira tem por onde escapar quando ela está a cozinhar arroz e feijão. Guillermo e a mulher partilham a única cama com os 4 fihos mais pequenos, enquanto Daisy e Jamid dormem juntos num colchão no chão.
À noite, Guillermo acende os candeeiros de petróleo. Ao pôr-do-sol senta-se no degrau da porta do corredor coberto com algumas tábuas que separam as duas únicas divisões, a cozinha e o quarto. Fumando um cigarro, tenta esquecer a dureza de um trabalho cujo rendimento mal dá para alimentar a família. Colher as bananas, fixar os feijoeiros, cavar a terra, deitar abaixo árvores às escondidas, espalhar o fertilizante e os pesticidas, cuidar dos dois animais - muito trabalho para um homem só. ...
Nídia Cifuentes inicia os preparativos para o festival serrano. ... Ao meio-dia todas as famílias se juntam. O alarido das crianças a brincar mistura-se com as canções do grupo musical Los Autênticos del Campo. Hoje vai ser inaugurado o novo edifício da Escola. ... "Os nossos filhos sobreviverão neste mundo com a ajuda do cabo, até que o Governo construa a ponte."»



Reportagem de Christoph Otto (texto e fotografias)
Traduzido por Aida Macedo
Expresso - REVISTA - 22 de Setembro de 2001

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

JESUS CRISTO



FIGURA CENTRAL DA HISTÓRIA


Como acontece com figuras notáveis, o cognome de Cristo, dado a Jesus, refere-se ao papel por Ele desempenhado no decurso da História.

Com efeito, a palavra Cristo, em grego Christos e em hebraico Mashiach, donde deriva a designação corrente de Messias, significa, em ambas as línguas,
ungido.


Segundo o Antigo Testamento, três espécies de pessoas eram ungidas: os profetas, os sacerdote e os reis. É precisamente no desempenho destas três funções - de profeta, sacerdote e rei - que Jesus aparece na História.


CRISTO, COMO PROFETA




Na Sagrada Escritura, profeta é aquele que fala em nome de alguém. É aquele que fala aos homens em nome de Deus; é, no sentido mais compreensivo da palavra, um porta-voz de Deus.

Quando Jesus inaugurou o Seu ministério, os crentes do Seu tempo viram n`Ele um profeta. Diziam: "Este é verdadeiramente o profeta que devia vir ao mundo." S. João 6:14.

É por isso que o Apóstolo Paulo declara, na epístola aos Hebreus, capítulo 1, versículo 1: "Havendo Deus antigamente falado muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias pelo Filho."

É na qualidade de profeta que Jesus assume o título de Mestre: "Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque Eu o sou" S. João 13:13; cf. S. Mateus 23:8-10.

E como eram os ensinos de Jesus?

Terminado o Sermão da Montanha, lemos que a "multidão se admirou da Sua doutrina, porquanto os ensinava como tendo autoridade, e não como os escribas" (S. Mateus 7:28 e 29), acerca dos quais se lê "dizem e não praticam" (S. Mateus 23:3).

O encanto dos ensinos de Jesus era tal que, em certa ocasião - o que motivou a segunda multiplicação dos pães - o Mestre disse: "Tenho compaixão da multidão, porque já está comigo há três dias, e não têm que comer; e não quero despedi-la em jejum, para que não desfaleça no caminho." S. Mateus 15:32.

Noutra ocasião, quando alguns homens foram enviados pelos sacerdotes e fariseus para prenderem a Jesus, em vez de O prenderem ficaram, eles próprios, literalmente presos das Suas palavras. E quando os que os tinham enviado lhes perguntaram: "Porque não O trouxestes?", eles não puderam deixar de testemunhar: "Nunca homem algum falou assim como este homem." S. João 7:44-46.

Na realidade, ao longo de toda a História, ninguém jamais falou como Jesus.

O ensino de Platão estendeu-se por cerca de quarenta anos; por um período idêntico se estendeu, mais perto de nós, o ensino de Kant. Mas perguntamos: Quem está hoje sendo influenciado para o bem pelos ensinos de Platão ou de Kant? Mais ainda: Quem estaria hoje disposto a dar a sua vida em defesa do ensino de qualquer desses filósofos?

O mesmo não se passa com os ensinos de Cristo. Apesar do Seu ministério se ter efectuado apenas durante uns escassos três anos e meio, e já há cerca de vinte séculos, quantos não estão sendo influenciados pela Sua doutrina; quantos não estão dispostos a dar a sua vida em defesa dessa doutrina?


CRISTO, COMO SACERDOTE


Depois da Sua morte expiatória na cruz do Calvário, Jesus ressuscitou e, passados quarenta dias, subiu ao Céu, onde está desempenhando as funções de
Sumo Sacerdote.



É na epístola aos Hebreus que o sacerdócio de Cristo no Santuário Celeste é particularmente salientado.


Lemos aí, com referência a Jesus, que "convinha que em tudo fosse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo que é de Deus, para expiar os pecados do povo." Hebreus 2:17. Ele é um "grande sumo sacerdote" (4:14), "um grande sacerdote sobre a casa de Deus" (10:21).

As suas qualidades são resumidamente descritas no capítulo 7:24-28: "Este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo. ... Porque nos convinha tal sumo sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores, e feito mais sublime do que os Céus; que não necessitasse, como os sumos sacerdotes, de oferecer cada dia sacrifícios, primeiramente pelos seus próprios pecados, e depois pelos do povo; porque isto Ele fez, uma vez, oferecendo-se a Si mesmo. Porque a lei constitui sumos sacerdotes a homens fracos, mas a palavra do juramento, que veio depois da lei, constitui ao Filho, perfeito para sempre."

Como nosso sacerdote, Ele conhece pessoalmente a cada um de nós, sabe o nosso nome, a casa onde moramos, não é estranho às nossas alegrias e tristezas, às nossas tentações e problemas, às nossas vitórias e fracassos, às nossas resoluções e promessas, ao alvo supremo das nossas vidas. Ele dedica-nos uma amizade inalterável, em comparação com a qual a dedicação do nosso mais íntimo amigo não passa de um pálido reflexo.


CRISTO COMO REI




Quando Pilatos, perante a acusação dos judeus, perguntou a Jesus se Ele era rei, o divino Acusado respondeu: "O Meu reino não é deste mundo." S. João 19:36, 37.

Não havia chegado ainda a hora da manifestação da Sua realeza. Antes disso, viria o Juízo, para apuramento dos súbditos do Seu reino. Apurados, pelo Juízo, os súbditos do Seu reino, Jesus manifestar-se-á, "como Rei dos reis e Senhor dos senhores" (I Timóteo 6:14, 15; Apocalipse 17:14) acompanhado por inumerável multidão de anjos, "os quais ajuntarão os Seus escolhidos" (S. Mateus 24:31), ressuscitando-os, se já desceram à sepultura; transformando-os, se se encontram ainda vivos, a fim de estarem para sempre com Ele. I Coríntios 15:15-58.

«Não quero porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os demais que não têm esperança. Porque se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem, Deus os tornará a trazer com Ele. Dizemo-vos, pois, isto pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem. Porque o mesmo Senhor descerá do Céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor. Portanto, consolai-vos uns aos outros com estas palavras.»I Tessalonicenses 4:13-18.

Tendo em vista este glorioso acontecimento, aconselha o apóstolo Paulo: "Todo o vosso espírito, e alma e corpo sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a Vinda de nosso Senhor Jesus Cristo." I Tessalonicenses 5:23.

O termo grego aqui usado para a Vinda é parousia, que era empregado para designar, no estilo técnico oficial de então, a vinda solene de um soberano a uma cidade ou reino, como sucedeu com Nero e Adriano, ao irem, como imperadores, à Grécia. Eram então celebrados grandes festejos; eram cunhadas moedas em que se fazia referência ao acontecimento; nalguns casos, como sucedeu com Adriano, a parousia do imperador marcou o início de uma nova era.

Se, na Grécia antiga, foram feitos os mais cuidadosos e dispendiosos preparativos para a parousia de imperadores moralmente tão indignos como Nero e Adriano, que preparativos deviam ser feitos, hoje, pelos crentes, para a parousia do grande Rei!



Ernesto Ferreira

Revista - Sinais dos Tempos
Publicadora SerVir

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Nem de menos...Nem de mais!




Canção das Mulheres


Que o outro saiba quando estou com medo,
e me tome nos braços
sem fazer perguntas demais.

Que o outro note quando preciso de silêncio e não saia batendo a porta,
mas entenda que não o amarei menos por que estou quieta.

Que o outro aceite que me preocupo com ele e não se irrite com minha solicitude,
e se ela for excessiva saiba me dizer isso com delicadeza ou bom humor.

Que o outro perceba minha fragilidade, e não se ria de mim, nem se aproveite disso.
Que se eu faço uma bobagem, o outro goste um pouco mais de mim,
porque também preciso fazer tolices tantas vezes.

Que se estou apenas cansada, o outro não pense logo que estou nervosa,
ou doente, ou agressiva, nem diga que reclamo demais.


Que o outro sinta quanto me dói a idéia da perda, e ouse ficar comigo mais um pouco,
em lugar de voltar logo à sua vida, não porque lá está sua verdade,
mas talvez seu medo, ou sua culpa.


Que se começo a chorar sem motivo depois de um dia daqueles,
o outro não desconfie logo que é culpa dele, ou que não o amo mais.

Que se estou numa fase ruim, o outro seja meu cúmplice,
mas sem fazer alarde, nem dizendo
"Olha que estou tendo muita paciência com você!"


Que se me entusiasmo por alguma coisa, o outro não a diminua,
nem me chame de ingénua, nem queira fechar essa porta necessária
que se abre para mim, por mais tola que lhe pareça.


Que, quando sem querer, eu digo uma coisa bem inadequada diante de mais pessoas,
o outro não me exponha nem me ridicularize.

Que quando me levanto de madrugada e ando pela casa,
o outro não venha logo atrás de mim reclamando:
"Mas que chateação essa sua mania, volta p'ra cama!"


Que se eu peço uma segundo bebida no restaurante,
o outro não comente logo: "Poxa, mais uma?!"

Que se eu eventualmente perco a paciência, perco a graça e perco a compostura,
o outro ainda assim me ache linda e me admire.

Que o outro:


filho,

namorado,

marido,

amigo,


não me considere sempre disponível, sempre necessariamente compreensiva,
mas me aceite quando não estou podendo ser nada disso.

Que, finalmente, o outro entenda que mesmo se às vezes me esforço,
não sou, nem devo ser, a mulher-maravilha,

mas apenas uma pessoa:
vulnerável
e forte, incapaz e gloriosa, assustada e audaciosa,

apenas...
"uma mulher".


Lia Luft



A EPIDEMIA DA INFERIORIDADE

Ele começou a vida com todos os obstáculos e desvantagens clássicas. A sua mãe era uma mulher dominadora, de vontade forte, que achava difícil amar as outras pessoas. Casou-se três vezes e o seu segundo marido divorciou-se dela porque o espancava regularmente. O pai da criança que estou descrevendo foi o seu terceiro marido. Morreu de um ataque cardíaco alguns meses antes do nascimento da criança. Como consequência, a mãe teve de trabalhar longas horas desde a mais tenra idade do filho.
Ela não lhe deu nenhum afecto, amor, disciplina ou educação nos primeiros anos da sua vida. Até o proibiu de lhe telefonar quando estava a trabalhar. As outras crianças não queriam saber dele, por isso estava quase sempre sozinho. Foi totalmente rejeitado desde pequeno. Era feio, pobre, mal-educado e detestável.
Quando tinha treze anos de idade o psicólogo de uma escola comentou que provavelmente o rapaz nem sabia o significado da palavra 'amor'.

Durante a adolescência as meninas não queriam saber dele e ele brigava com os garotos. Apesar de um Quociente de Inteligência alto, fracassou na escola e finalmente desistiu de estudar no terceiro ano.
Pensou que seria aceite na Marinha. Eles formavam homens, é o que se dizia, e ele queria ser um Homem. Mas os seus problemas acompanharam-no. Os outros marinheiros riam dele e ridicularizavam-no. Ele defendeu-se, resistiu à autoridade, enfrentou a corte marcial e foi expulso da Marinha com uma dispensa desonrosa.
Ali estava ele – um jovem com pouco mais de vinte anos – absolutamente sem amigos e naufragado. Era pequeno e magro. A sua voz era esganiçada como a de um adolescente. Estava ficando calvo. Não tinha talento, nem habilidade, nem valor. Nada.

Novamente pensou que podia fugir dos seus problemas se fosse morar num país estrangeiro. Mas lá também foi rejeitado. Nada mudou. Enquanto lá esteve, casou-se com uma jovem que era filha ilegítima e trouxe-a com ele de volta aos Estados Unidos. Mas logo ela começou a criar o mesmo desprezo por ele que todos demonstravam. Deu-lhe dois filhos, mas ele jamais desfrutou do status e do respeito que um pai deve ter.

O seu casamento continuou a esfacelar-se. A sua esposa exigia, cada vez mais, coisas que ele não lhe podia dar. Em lugar de aliar-se a ele contra o mundo amargo, como ele esperava, tornou-se o seu mais perverso oponente. Podia derrotá-lo nas brigas e aprendeu a intimidá-lo. Em determinada ocasião, trancou-o na casa de banho para castigá-lo. Finalmente, forçou-o a abandoná-la.

Tentou viver sozinho, mas sentia-se terrivelmente solitário. Depois de dias de solidão, foi para casa e literalmente implorou que ela o aceitasse de volta. Perdeu todo o orgulho. Rastejou. Humilhou-se. Aceitou as suas exigências. Apesar do seu magro salário, deu-lhe algum dinheiro de presente, dizendo que podia gastá-lo como bem entendesse. Mas ela riu-se dele. Zombou das suas frágeis tentativas para sustentar a família. Ridicularizou o seu fracasso. Zombou da sua impotência sexual diante de um amigo que lá estava.
Em certa ocasião, quando as trevas do seu pesadelo particular o envolveram, caiu de joelhos e chorou amargamente.

Finalmente, em silêncio, deixou de lutar. Ninguém o queria. Ninguém jamais o quisera. Talvez fosse o homem mais rejeitado da actualidade. O seu ego jazia despedaçado, feito pó!
No dia seguinte, tornou-se um homem estranhamente diferente. Levantou-se, foi à garagem e apanhou uma espingarda que ali escondera. Levou-a consigo para o emprego, que acabara de arranjar, num depósito de livros.

E de uma janela do quinto andar daquele prédio, logo depois do almoço, no dia 22 de Novembro de 1963, atirou duas balas que esfacelaram a cabeça do Presidente John Fitzgerald Kennedy.

Lee Harvey Oswald, o rejeitado, o detestável fracasso, matou o homem que, mais do que qualquer outro homem na face da terra, personificava todo o sucesso, beleza, riqueza e amor familiar que lhe faltavam. Ao disparar aquelas balas, utilizou a única habilidade que adquirira em toda a sua miserável vida.


Os problemas pessoais de Oswald não justificam o seu comportamento violento, é claro, e eu não tentaria absolvê-lo da culpa e da responsabilidade. Mas uma compreensão do seu tormento interior e da sua confusão ajuda-nos a vê-lo, não só como um perverso assassino, mas também como o homem digno de dó e derrotado em que se transformou. Em cada dia da sua vida, desde os solitários dias da infância até o momento televisionado da sua morte espectacular, Oswald experimentou a consciência esmagadora da sua própria inferioridade.
Finalmente, como geralmente acontece, a sua angústia transformou-se em ira.

A maior das tragédias é que a situação angustiosa de Lee Harvey Oswald não é coisa fora do comum no mundo hoje.
Enquanto outros talvez reajam menos agressivamente, esta mesma percepção consumidora, de insuficiência, pode ser encontrada em todos os caminhos da vida - em cada vizinhança, em cada igreja e em cada ambiente escolar. É particularmente verdadeiro quanto aos adolescentes de hoje.
Tenho observado que a grande maioria dos que estão entre os doze e os vinte anos de idade sentem-se amargamente desapontados com o que são e o que representam. Num mundo que adora os 'super-stars' e os homens-milagres, eles olham no espelho à procura de sinais de grandeza, e encontram apenas um caso terminal de acne.
A maioria desses jovens desanimados não admitirá o que sente porque dói reconhecer esses pensamentos íntimos. Oswald jamais tornou públicas as dúvidas que tinha de si mesmo e a sua solidão - nem lhe teríamos dado ouvidos se o fizesse.

Assim, grande parte da rebeldia, insatisfação e hostilidade dos adolescentes emana dos sentimentos avassaladores e incontroláveis de inferioridade e incapacidade que, raramente, encontram expressão verbal.


Mas os adolescentes não estão de modo nenhum sozinhos nesta desvalorização pessoal. Cada idade apresenta as suas ameaças próprias e únicas ao amor-próprio. Como pretendo discutir, as criancinhas sofrem tipicamente de uma severa perda de status durante os mais tenros anos da infância. Do mesmo modo, a maioria dos adultos ainda está tentando conviver com a inferioridade experimentada no começo da vida. E estou convencido que a senilidade e a deterioração mental no fim da vida frequentemente resultam da crescente percepção que os idosos experimentam de que estão vivendo num mundo exclusivamente de jovens; no qual rugas, dores lombares e dentaduras são assuntos de zombaria; onde as suas ideias estão fora de moda e a sua existência infinita é um peso.
Este sentimento de inutilidade é a recompensa especial que reservamos para os sobreviventes da vida, e não me surpreendo que os idosos frequentemente 'se desliguem' intelectualmente.

Assim, se o sentimento de incapacidade e inferioridade são tão universalmente dominantes em todas as idades da vida actual, temos de nos perguntar:
Porquê?


Porque é que os nossos filhos não podem crescer aceitando-se como são? Por que tantos sentem que não são amados e que são detestáveis? Por que os nossos lares e escolas produzem mais desespero e autodesprezo em lugar de confiança, calma e respeito? Por que todas as crianças têm de bater com a cabeça na mesma velha roda? Estas perguntas são muitíssimo significativas para os pais que desejam proteger os seus filhos da agonia da inferioridade.


Alguns dos pequeninos vão-se sentir tão inferiores
que pensarão que até Deus não poderia amá-los.
Sentem-se tão completamente indignos e vazios,
a pensar que Deus não se importa nem compreende.


Chris era uma criança assim. Escreveu o seguinte bilhetinho ao Dr. Richard A. Gardner,
um psicoterapeuta que trabalha com crianças:



"Querido Doutor Gardner

O que me está a chatear é que há muito tempo uma pessoa grande,
um menino de mais ou menos 13 anos de idade, chamou-me de tartaruga;
e eu sei que ele disse isso por causa da minha cirurgia plástica.
E eu acho que Deus me odeia por causa do meu lábio. E quando eu morrer
Ele provavelmente vai me mandar para o inferno.

Com amor, Chris"

Você é capaz de sentir a solidão e o desespero de Chris?
Que infelicidade para uma criança de 7 anos de idade crer que já é odiada por todo o universo!
Que desperdício de potencial desde o momento do seu nascimento!
Que sofrimento desnecessário suportará por toda a sua vida!

Mas Chris é apenas outra vítima do sistema estúpido e vazio de avaliação do mérito humano
- um sistema que destaca os atributos que não podem ser obtidos pela maioria dos nossos filhos.
Em lugar de recompensar a honestidade, a integridade, a coragem, a habilidade, o humor, o espírito maternal, a lealdade, a paciência, a diligência, ou outras virtudes que eram louvadas antigamente, reservamos o crédito máximo para os jovens inteligentes que 'têm boa aparência' na praia.

Não seria apropriado que abandonássemos esta discriminação desnecessária?

A actual epidemia de insegurança resultou dum sistema totalmente injusto e desnecessário de avaliação dos valores humanos, agora predominante na nossa sociedade. Nem todos são considerados dignos; nem todos são aceites. Pelo contrário, reservamos o nosso louvor e admiração para alguns poucos escolhidos que foram favorecidos desde o nascimento com características que consideramos de alto valor. É um sistema perverso, e nós, na qualidade de pais, temos de contrabalançar o impacto. Este livro procura demonstrar que todas as crianças têm valor e devem receber o direito ao respeito e à dignidade pessoais.  Pode ser feito!

... Espero que o leitor veja com que eficiência (e geralmente sem tomar consciência do facto) ensinamos às nossas criancinhas que o mérito e a aprovação social estão além do seu alcance. Assim, glorificando um modelo idealizado ao qual poucos conseguem igualar-se, criamos um imenso exército de 'joões-ninguém' - que nasceram perdedores e ficaram desanimados da vida antes de realmente ela começar. Tal como Lee Harvey Oswald, voltam-se para cá e para lá, a procurar, em vão, uma solução para o seu vazio e sofrimento interiores. Para os milhões que nunca a encontram, a estrada para o mérito pessoal transforma-se num longo desvio, não pavimentado, que não leva a lugar nenhum.

A questão do mérito pessoal não é apenas uma preocupação daqueles que têm falta dele. Num sentido bem real, a saúde de toda a sociedade depende da facilidade com que os seus membros individualmente podem obter aceitação pessoal.

Assim, sempre que as chaves do amor-próprio parecem estar fora do alcance de uma grande percentagem de pessoas, há uma ocorrência ampla e certa de 'doenças mentais', neurose, alcoolismo, abuso de drogas, ódio, violência e desordem social. O mérito pessoal não é uma coisa que os seres humanos têm a liberdade de pegar ou largar. Precisamos dele e, quando é inatingível, todos sofrem.


Esconde-Esconde - Editora Vida
James Dobson
Psicólogo
(Ler mais em Meditação para a Saúde,
AUTO-ESTIMA, 01/10/2010)